Pai Nilson em fotografia do ano de 2023. |
Nilson Nascimento Machado nasceu em 18 de julho de 1979, na cidade de Igarapé-Miri, no estado do Pará. Desde o nascimento, sua vida esteve profundamente entrelaçada com o universo espiritual. Ele vem de uma tradicional família de Aché, carregando consigo uma forte ligação com as religiões de matriz africana.
Sua trajetória espiritual teve início formal no ano de 1993, quando começou sua caminhada como pai de santo, embora seus dons mediúnicos tenham se manifestado desde muito cedo. Ainda criança, Nilson já tinha visões e conversava com entidades espirituais. Aos 8 anos, passou por sua primeira experiência de transe e, aos 12, realizou sua primeira incorporação.
O primeiro terreiro em que teve ligação pertencia ao seu tio, Elias de Mariana. Após o falecimento precoce do tio e a derrubada do terreiro, sua mãe, também envolvida com a espiritualidade e filha de umbanda, decidiu abrir sua própria casa. No entanto, ela também veio a falecer, e a casa novamente foi desfeita. Diante dessas perdas, Nilson liderou a fundação de uma nova casa de Santo, que, com muito esforço e resistência, já soma quase 20 anos de atividades, celebrando anualmente a festa das entidades Cabocla Jussara e Cabocla Jacira.
Pai Nilson no Terreiro Rainha Fina Joia. |
Em 2019, durante uma tradicional festividade, a casa foi alvo de intolerância religiosa. Um grupo fundamentalista invadiu o espaço sagrado com ofensas, sal e óleo, tentando interromper a celebração. Apesar da tentativa de agressão, os filhos e filhas de santo reagiram com fé e firmeza. O toque dos tambores se intensificou e os caboclos se manifestaram, levando os agressores a se retirarem do local. Nilson denunciou o caso à delegacia, exigindo justiça. O delegado, reconhecendo o direito constitucional à liberdade religiosa, abriu um processo contra os responsáveis.
Pouco tempo depois, Nilson enfrentou uma das experiências mais dolorosas de sua vida. Enquanto organizava mais uma festividade religiosa, percebeu a presença estranha de um homem que o observava. No final daquele mesmo dia, esse homem invadiu sua casa e disparou três tiros. Nenhum dos disparos atingiu órgãos vitais, um milagre, segundo os médicos que o atenderam em Belém. Após o atentado, Nilson se retirou para a casa de um filho de santo em Abaetetuba, onde passou três meses afastado, enfrentando um período de profunda solidão, perda e depressão.
Durante esse momento de escuridão, Nilson teve uma visão espiritual: uma senhora vestida de branco e azul, com um cachimbo na mão, lhe apareceu e o orientou a fazer uma campanha de terço, rezando pela manhã e à noite, para fortalecer sua fé e vencer o medo. Ele seguiu o conselho e, aos poucos, recuperou sua energia espiritual.
Ao retornar à sua casa de Santo, encontrou o terreiro sujo e em estado de abandono. As imagens estavam cobertas de poeira, o espaço tomado por folhas. Diante da cena, Nilson chorou profundamente, mas decidiu que não iria desistir. Com ajuda de antigos amigos e filhos de santo, limpou o barracão e reergueu o espaço. A entidade Caboclo Ubirajara se manifestou e lhe deu uma ordem clara: permanecer ali e não fugir mais.
Nilson perdoou o autor do atentado. Para ele, a justiça pertence a Deus. Acredita que pagar o mal com o mal não eleva ninguém, e que cada um será cobrado pelas próprias escolhas. Desde o ocorrido, passaram-se cinco anos. A casa de Santo cresceu, se fortaleceu, e hoje é referência na cidade de Igarapé-Miri.
Com firmeza, Nilson sempre defende o respeito entre as religiões. Para ele, não existe fé melhor do que a outra, em todas Deus habita. Ele acredita que toda religião tem como princípio tornar as pessoas melhores, mais amorosas, compassivas e solidárias. O confronto, diz ele, não leva a lugar algum. O que o mundo precisa é de respeito e paz.
Recentemente, recebeu em sua casa pessoas do Testemunho de Jeová e teve com elas uma conversa respeitosa e agradável. Para Nilson, esse é o exemplo de convivência que deve ser cultivado: ouvir, dialogar, sem conflito. Ele encerra sua mensagem pedindo bênçãos ao grande pai Zambapongo e que a orixá Dandalunda derrame suas águas sobre todos e todas. Em tempos de guerras, fome e sofrimento, ele acredita que somente a fé e a união entre os povos podem trazer a paz verdadeira.
A trajetória de Nilson Nascimento Machado é marcada por coragem, espiritualidade e resiliência. Um líder religioso que, mesmo diante das maiores provações, escolheu seguir com fé e espalhar respeito. Um exemplo vivo de que a ancestralidade é força, e que a cultura afro-brasileira resiste por meio de seus filhos e filhas.